Diferentemente do que disse Lula, familiar de juiz não matou Antônio Conselheiro em Canudos

Não é verdadeira a declaração de Lula de que um parente do presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, matou Antônio Conselheiro, líder da revolta de Canudos, no fim do século 19.

Em ato na terça (16), o petista afirmou: “Esse cidadão é bisneto do general que invadiu Canudos e matou Antônio Conselheiro. Talvez ele ache que eu seja cidadão de Canudos”.

Foram três as incorreções do ex-presidente da República.

Segundo o TRF-4, Flores é na verdade sobrinho trineto de Tomás Thompson Flores.

Ele era coronel, e não general, quando foi morto em combate durante tentativa do Exército de subjugar o arraial baiano.

O militar, que também foi deputado federal no começo da República, foi morto em junho de 1897.

Conselheiro só morreria em setembro daquele ano.

Prisioneiros feitos pelo Exército em Canudos (Flávio de Barros/Arquivo Histórico do Museu da República)

Em “Os Sertões”, obra que tornou célebre o conflito em Canudos, Euclydes da Cunha escreveu sobre o trisavô do juiz: “Era um lutador de primeira ordem. Embora lhe faltassem atributos essenciais de comando e, principalmente, esta serenidade de ânimo, que permite a concepção fria das manobras dentro do afogueamento de um combate –sobravam-lhe coragem a toda a prova e um quase desprezo pelo antagonista por mais temeroso e forte, que o tornavam incomparável na ação”.

Em seguida, Cunha faz o relato que levou à morte do militar, que, impetuoso e descuidado, avançou sobre os inimigos identificado como oficial, tornando-se alvo fácil.

“A sua brigada investiu, batida em cheio pelos fogos diretos do inimigo entrincheirado; e, quase cem metros da posição primitiva, a vanguarda desenvolveu-se em atiradores. O coronel Flores que, a cavalo, lhe tomara a frente, descavalgou, então, a fim de pessoalmente ordenar a linha de fogo. Por um requinte dispensável, de bravura, não arrancara dos punhos os galões que o tornavam alvo predileto dos jagunços. Ao reatar-se, logo depois, a avançada, baqueou, ferido em pleno peito, morto.”

Tendo à frente Conselheiro e seu rígido messianismo católico, o movimento de Canudos ficou famoso não apenas graças a Euclydes da Cunha, mas pela façanha dos revoltosos miseráveis de rechaçar seguidas ofensivas do Exército brasileiro.

A então jovem República ganhou a opinião pública ao vender Conselheiro e seus seguidores como fanáticos ligados a um plano para restaurar a monarquia.

O corpo exumado de Antônio Conselheiro (Flávio de Barros/Arquivo Histórico do Museu da República)

O experimento comunal de Canudos, que atraiu sertanejos empobrecidos da região, e a repressão dele pelos militares fez com que, décadas depois, o líder da revolta fosse resgatado como ícone na esquerda brasileira.

AVÔ NO SUPREMO

Além de parente do coronel de trágico fim, o presidente do TRF-4 é neto do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Thompson Flores.

Nomeado para a corte pelo presidente Costa e Silva, segundo militar a comandar o país sob a ditadura militar, o ministro Flores guarda em sua biografia críticas ao regime.

Em 1977, ano em que assumiu a presidência do STF, ele defendeu o fim das restrições contidas nos atos institucionais. Voltou ao tema no ano seguinte, quando disse esperar para breve o fim do AI-5.