Antecipação de eleição presidencial jamais ocorreu no Brasil fora de ditaduras ou mudanças de regime
Partidos e movimentos de esquerda, como o PT, têm discutido a ideia de antecipar para este ano, logo após uma eventual queda de Michel Temer, as eleições gerais marcadas para outubro de 2018.
A antecipação ou o adiamento de um pleito presidencial não encontra paralelos nos 127 anos da república brasileira, exceto em momentos de ditadura ou de transição de regime.
(Vale registrar quão improvável é botar o plano em prática com o Congresso majoritariamente resistente mesmo a hipótese mais simples: a proposta de emenda à Constituição que permitiria elegermos diretamente um presidente-tampão que governaria só até o fim de 2018, sem eleição também de novos deputados e senadores. Tamanha é a dificuldade que petistas admitem que o que vale é apoiar diretas, não necessariamente com uma eleição geral antecipada.)
As ditaduras de Getúlio Vargas ou a militar foram pródigas em mudar datas de eleições e as regras do jogo em curso.
Chegando ao poder na marra em 1930, Vargas foi escolhido presidente indiretamente em 1934, quatro anos após perder uma eleição direta.
Ao instalar seu Estado Novo em 1937, deixou de realizar o pleito presidencial previsto para o ano seguinte. Empurrou a eleição com a barriga até onde pôde –ela só ocorreria após o ditador ser forçado a entregar o poder, no fim de 1945.
Desembarcando no poder em 1964, o regime militar teve como primeiro presidente o marechal Humberto Castelo Branco (foto no alto do post) eleito indiretamente pelo Congresso logo após o golpe de 1964 –a ditadura deixou de realizar o pleito direto previsto para 1965.
Entre outros arbítrios, Ernesto Geisel emendou em 1977 a própria Constituição imposta pela ditadura para ampliar o mandato presidencial de cinco para seis anos –o beneficiário foi o general João Baptista Figueiredo, que governou de 1979 a 1985.
Sucessor de Figueiredo, Tancredo Neves foi eleito por voto indireto do Congresso, ainda de acordo com as normas do regime que saía de cena. O vice José Sarney viu o próprio mandato ser encurtado para cinco anos pela Constituição de 1988. A eleição que seria em 1990 foi em 1989.
Foram derrotados os constituintes que queriam ainda menos tempo: quatro anos de mandato –o que só ocorreria por meio de uma emenda constitucional de revisão em 1994.
Fora esses períodos de exceção ou de transição democrática, os pleitos presidenciais sempre ocorreram de acordo com o previsto, como costuma ser regra em regimes presidencialistas. Nos parlamentaristas, antecipações são comuns, vide o Reino Unido hoje.
PRESIDENTE POR SEIS ANOS E MEIO
Apesar de todo o ineditismo, o especialista em história constitucional Luiz Guilherme Arcaro Conci, professor da PUC-SP, defende uma antecipação do pleito presidencial –mas apenas dele, por entender a renovação periódica do Congresso a cada quatro anos fomenta a confiança na democracia.
Conci diz considerar plenamente constitucional que, via emenda à Carta devidamente aprovada por deputados e senadores, seja definido que o presidente eleito cumpra o que resta de mandato de Temer mais os quatro anos do mandato seguinte, de 2019 a 2022.
“É uma medida excepcional, mas que fomenta a participação do povo. É ele quem tem que decidir em momentos de crise como deve ser formulada uma transição. Se não, caímos em um modelo de democracia elitista, onde uma parcela desse povo entende-se habilitada para resolver a situação”, afirma.
“Quando você faz mudanças na Constituição em momentos democráticos para aprofundamento da legitimação popular, você não pode entender como casuísmo.”