Há 80 anos, um senador era preso por apoiar comunistas

Rodrigo Vizeu

Há quase 80 anos, um outro senador da República foi preso no país no exercício do mandato.

No caso, não sob acusação de obstruir investigações, como o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), mas de questionar o governo de Getúlio Vargas.

Em novembro de 1935, o paraense Abel Chermont integrava a oposição a Vargas e ajudou a criar o Grupo Parlamentar Pró-Liberdades Populares, contrário à implantação de medidas repressivas do governo contra a Aliança Nacional Libertadora, organização apoiada pelo antigo Partido Comunista Brasileiro.

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Senador Abel Chermont (PA). Crédito: Arquivo Senado

Quando os comunistas tentaram um golpe frustrado no fim daquele ano, Vargas reforçou as medidas de exceção e Chermont dobrou a aposta de seu oposicionismo. Denunciou no Senado abusos e violências da reação governista.

Em março de 1936, acabou preso sob acusação de estar a serviço do líder comunista Luís Carlos Prestes. Junto com ele, foram presos os deputados Domingos Velasco (GO), Abguar Bastos (PA), Otávio da Silveira (PR) e João Mangabeira (BA), membros do mesmo grupo.

Segundo relato do escritor Graciliano Ramos, o senador foi “arrancado violentamente de casa, entrado em luta física desigual, levado a braços como um fardo resistente, metido no cárcere e aguentado sevícias, por se haver oposto, no Senado, aos desmandos selvagens da ditadura policial reinante”.

O senador negou as acusações, mas ficou preso por mais de um ano até ser absolvido.

Prenderam o patriarca

A prisão de parlamentares, na verdade, nasce praticamente com a história do Brasil.

Em novembro de 1823, pouco mais de um ano após a independência, os constituintes que elaboravam a primeira Constituição do novo país entraram em conflito com dom Pedro 1º sobre o texto.

As tropas imperiais cercaram a Assembleia Constituinte. O episódio, que ficou conhecido como “noite da agonia”, acabou com a prisão e o exílio de deputados, entre eles o patriarca da independência, José Bonifácio. O monarca acabou outorgando sua própria versão de Constituição.

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José Bonifácio retratado por Benedito Calixto.

Outro caso de deputado preso ocorreu na ditadura militar iniciada em 1964. Sob o governo de Ernesto Geisel, em 1974, Chico Pinto (MDB-BA) perdeu o mandato e foi condenado a seis meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ter feito discurso denunciando violências da ditadura de Augusto Pinochet, no Chile.

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Deputado Chico Pinto, preso pela ditadura de Geisel por criticar a ditadura de Pinochet. Crédito: Lula Marques/Folhapress

Os estertores da ditadura tiveram ainda a detenção dos deputados Aldo Arantes (PMDB-GO) e Jacques D’Ornellas (PDT-RJ) por participarem de ato na Esplanada de Ministério pelas Diretas, em 1984.

Os dois foram alvos das medidas para “preservar a ordem pública” impostas pelo governo João Figueiredo durante as votações no Congresso.

Novos tempos

Após a redemocratização do país, exceto pelo caso de Delcídio do Amaral, as prisões de parlamentares vieram após condenações na Justiça.

Também passaram a se referir menos a contestações do regime da vez e mais a práticas individuais.

Em 2013, o deputado Natan Donadon (ex-PMDB-RO) teve prisão decretada após ser condenado por envolvimento em desvios na Assembleia Legislativa de Rondônia –conciliou cadeia e mandato até ser cassado.

Depois de condenação no mensalão, foram presos os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), que renunciaram.

Também renunciou Asdrúbal Bentes (PMDB-PA), condenado sob acusação de esterilizar eleitoras em troca de votos.