A História Como Ela Foi https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br passagens marcantes e curiosidades do Brasil e do mundo Sat, 14 Jul 2018 05:00:55 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Há cem anos, Brasil enfim entrava na Primeira Guerra Mundial https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/2017/11/08/ha-cem-anos-brasil-declarava-guerra-a-alemanha-na-primeira-guerra-mundial/ https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/2017/11/08/ha-cem-anos-brasil-declarava-guerra-a-alemanha-na-primeira-guerra-mundial/#respond Wed, 08 Nov 2017 20:47:38 +0000 https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/files/2017/11/R039-f01-180x108.jpg http://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/?p=736 Países que sentiram na carne a barbárie da Primeira Guerra Mundial, França e Reino Unido (e algumas de suas ex-colônias, como Canadá e Austrália) se preparam para um dia solene de seus calendários nacionais: 11 de novembro, aniversário do fim do primeiro conflito global do século 20.

O armistício completa 99 anos nesta sexta-feira.

Na França, é tradicionalmente lembrado com um feriado e cerimônias oficiais. Britânicos, canadenses, australianos e neozelandeses usam em massa, nessa época, flores vermelhas (poppies) no peito, honrando os mortos em guerras.

Neste ano, mais especificamente no último dia 26 de outubro, completaram-se 100 anos que o Brasil declarou guerra à Alemanha em 1917, entrando enfim no conflito mundial que começara em 1914 e acabaria em 1918.

Apesar de ser uma data mais cheia que a celebração do armísticio, o centenário da estreia brasileira na Primeira Guerra foi largamente ignorado.

Em grande medida, pelo fato de a participação do Brasil no conflito ter sido discretíssima.

FIM DA NEUTRALIDADE, AINDA QUE TARDIO

Durante a maior parte da guerra, o país optou por se manter neutro no confronto que opôs as lideranças encabeçadas de um lado por Reino Unido e França e, do outro, por Alemanha e Império Austro-Húngaro.

Lobbies internos pressionavam por apoio a um dos lados, fossem entre os imigrantes alemães concentrados no Sul ou a elite intelectual francófila da época –sendo o segundo grupo de pressão muito maior e mais influente.

Presidente Wenceslau Braz assina declaração de guerra à Alemanha

Em outubro de 1917, diante de mais um torpedeamento de navio brasileiro pela Alemanha, enfim veio o decreto assinado pelo presidente Wenceslau Braz, um daqueles mandatários da República Velha que a maioria de nós tem dificuldades de lembrar: “Fica reconhecido e proclamado o estado de guerra iniciado pelo império alemão contra o Brasil”.

Primeira página do jornal “O Estado de S. Paulo” com a manchete “O Brasil na guerra”

A declaração de guerra foi comemorada por Ruy Barbosa, então senador opositor, conforme registrou à época “O Estado de S. Paulo”: “Todos os povos civilizados estavam no dever de dar o seu concurso de sangue a esta tremenda carnificina criada pela Alemanha. Ao darmos este passo, o mais grave que temos dado, não se trata de irmos defender na Europa os interesses dos aliados –o Brasil vai defender-se a si mesmo, vai defender a sua existência moral e a sua existência política, vai defender a estabilidade de seu território”.

ATAQUE AOS GOLFINHOS

O concurso de sangue brasileiro se mostraria diminuto.

Um grupo de oficiais foi enviado para a França e uma missão médica brasileira foi instalada em Paris. Treze pilotos foram emprestados à Força Aérea Britânica.

A maior, embora pequena, contribuição foi da Marinha, que enviou uma divisão naval para patrulhar a costa da África.

Tendo zarpado apenas em julho de 1918, a força sofreu baixas em uma escala africana devido à gripe espanhola e chegou à Europa um dia antes do fim da guerra. Ficou marcada pelo episódio em que confundiu golfinhos com um submarino alemão, levando a um massacre de cetáceos.

O historiador militar Carlos Daróz registra em seu “O Brasil na Primeira Guerra Mundial: a longa travessia” que quase 200 brasileiros morreram nos navios e campos da batalha da Grande Guerra, “a maioria vitimada pela pandemia de gripe espanhola e outros em decorrência de acidentes durante as operações”.

Outros tantos lutaram como voluntários pelas nações em que nasceram, caso de muitos imigrantes italianos e alemães –ou dos príncipes exilados dom Luís e dom Antônio de Orléans e Bragança, filhos da princesa Isabel, que lutaram do lado britânico.

EFEITOS ECONÔMICOS

Se não houve muito sangue brasileiro derramado, os principais efeitos da Primeira Guerra no país foram políticos e econômicos.

O país, à época agrário e iletrado, sofreu com a queda da venda de café e com a dificuldade de comprar bens industrializados da Europa. O foco do país alterou-se para os Estados Unidos, não apenas econômica, mas diplomaticamente.

O morticínio da Grande Guerra trouxe ainda um desencanto da elite pensante do país sobre a Europa, tema sobre o qual já tratei nessa entrevista publicada em 2014 com o historiador francês Olivier Compagnon, autor do livro “Adeus à Europa”.

A atuação modesta trouxe, porém, alguns frutos ao país, então extremamente periférico, em termos de estatura diplomática. Como país beligerante, o Brasil pôde participar da Conferência de Paz de Paris de 1919, onde conseguiu indenizações e a compra a preço simbólico de navios alemães apreendidos.

Representantes internacionais durante a Conferência de Paris; o 2º da direita para a esquerda, sentado, é o presidente eleito brasileiro Epitácio Pessoa; o presidente americano Woodrow Wilson é o 8º da direita para a esquerda, de pé

Já ouviu o podcast da História Como Ela Foi? Está disponível no aplicativo de podcast do iPhone, no SoundCloud, no Stitcher e no TuneIn.

]]>
0
Abordagem britânica de ‘Dunkirk’, de Christopher Nolan, melindra franceses https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/2017/08/02/abordagem-britanica-de-dunkirk-de-christopher-nolan-melindra-franceses/ https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/2017/08/02/abordagem-britanica-de-dunkirk-de-christopher-nolan-melindra-franceses/#respond Wed, 02 Aug 2017 05:00:10 +0000 https://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/files/2017/08/CX154_2707_9-180x120.jpg http://ahistoriacomoelafoi.blogfolha.uol.com.br/?p=707 Aclamado por seu relato sobre um episódio sombrio da história britânica, “Dunkirk”, de Christopher Nolan, produziu baixas do outro lado do canal da Mancha. O filme feriu alguns brios na França, onde houve incômodo com o papel secundário que o país recebeu na produção americana.

“Por que ‘Dunkirk’ de Nolan é uma aberração histórica”, ataca reportagem da revista “Les Inrockuptibles”.

O jornal “Le Figaro” acusa o filme de passar “deliberadamente à margem da questão histórica”, tratando os militares franceses como “silhuetas furtivas e ridículas”.

A suposta ofensa à honra nacional consiste no fato de o filme não ter explorado o papel da França no resgate da Força Expedicionária Britânica de Dunquerque, no norte francês, em 1940.

O episódio simbolizou a incapacidade de Reino Unido e França fazerem frente ao avanço alemão no início da Segunda Guerra Mundial.

Cercados em poucas semanas de conflito, os britânicos concluíram que era melhor abandonar o continente e defender sua ilha. A virada na França só viria quatro anos depois, com a crucial presença dos Estados Unidos.

No filme, os franceses surgem em quatro momentos fugazes: em uma trincheira que protege a praia onde os ingleses esperam para fugir; quando um grupo do país é barrado ao tentar embarcar; com a revelação de que um soldado da França vestia um uniforme britânico para escapar; e citados por um oficial inglês.

Imagem registra embarque de soldados franceses em Dunquerque

Pode parecer suficiente quando se pensa na escolha de Nolan de se concentrar, sem muito contexto, na tentativa de sobrevivência inglesa.

Mas, em sua bronca com a superprodução, os franceses reclamam de não ter havido menção ao fato de que 40 mil soldados do país defendiam a retaguarda –contra alemães mais numerosos e bem armados– enquanto os britânicos eram evacuados.

Melindram-se ainda por “Dunkirk” ter preferido enfocar o heroísmo dos civis ingleses que ajudaram no resgate, ignorando que parte significativa da frota usada para o transporte era da Marinha francesa, que perdeu três destróieres na empreitada.

Outra ausência que a imprensa do país registra, esta sem tanta ênfase, é a de que cerca de um terço dos soldados salvos eram da França.

O historiador Dominique Lormier, autor de livro sobre a batalha, buscou apaziguar os aliados históricos.

Disse em entrevista que, “embora seja lamentável que o filme não enfatize suficientemente a contribuição dos franceses”, é “honesto” e relata “um ponto de vista anglo-saxão que não tem uma visão panorâmica dos acontecimentos”.

Memorial em homenagem a franceses e aliados mortos na batalha de Dunquerque

O cerne do mal-estar parece estar no fato de “Dunkirk” se passar durante o curto período em que a França de fato lutou na Segunda Guerra.

O país, que partiu para o combate acreditando em suas linhas de defesa, acabaria invadido, humilhado e governado por fantoches que colaboraram com os nazistas.

“Essa é uma questão de extrema delicadeza na França por conta da absoluta inépcia com que o Exército se portou e foi rapidamente desbaratado pelas forças alemãs”, diz o professor de história da USP Everaldo de Oliveira Andrade.

A crítica do jornal “Le Monde” observa que a época do embarque de Dunquerque foi um “raro momento desta guerra que honra o heroísmo do Exército francês”.

A versão francesa da “Slate” foi ainda mais sincera: “Teria sido a oportunidade –perdida– de lembrar aos americanos que os franceses não são em 1940 os famosos rendidos comedores de queijo”.

]]>
0